O ministro Celso de Mello, decano do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu, nesta sexta-feira (22), abrir o sigilo da gravação da reunião ministerial de 22 de abril. O material foi apontado pelo ex-ministro Sérgio Moro como prova de que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tentou interferir na autonomia da Polícia Federal.
Confira o trecho do vídeo ministerial em que o presidente fala
O vídeo faz parte do inquérito, autorizado pelo magistrado a pedido da Procuradoria Geral da República, para apurar a acusação feita por Sérgio Moro ao deixar o Ministério da Justiça e Segurança Pública um mês atrás. As investigações apuram se o presidente agiu para tentar evitar que familiares e amigos fossem investigados.
O pivô para a crise foi a exoneração do então diretor-geral da PF Maurício Valeixo, nome de confiança de Moro, em 24 de abril. Poucas horas após a publicação no Diário Oficial, o ministro deixou o cargo, acusando Bolsonaro de tentar interferir na corporação.
“Determino o levantamento da nota de sigilo imposta em despacho por mim proferido no dia 08/05/2020 (Petição nº 29.960/2020), liberando integralmente, em consequência, tanto o conteúdo do vídeo da reunião ministerial de 22/04/2020, no Palácio do Planalto, quanto o teor da degravação referente a mencionado encontro de Ministros de Estado e de outras autoridades”, escreveu o ministro no despacho.
Na decisão, Celso de Mello liberou tanto a íntegra do vídeo quanto da transcrição da reunião. Ele apenas não permitiu a divulgação de “poucas passagens do vídeo e da respectiva degravação nas quais há referência a determinados Estados estrangeiros”.
O ministro do STF diz na decisão que o sigilo do vídeo não poderia ser mantido em respeito ao princípio da transparência, que “traduz consequência natural do dogma constitucional da publicidade, que confere, em regra, a qualquer pessoa a prerrogativa de conhecimento e de acesso às informações, aos atos e aos procedimentos que envolvam matéria de interesse público”.
Ele ainda disse que o Executivo não decretou o vídeo como “ultrassecreto, secreto ou reservado” e disse que a a reunião “não tratou de temas sensíveis nem de assuntos de segurança nacional”.
Celso de Mello comentou ainda sobre os ataques feitos pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub, ao STF. Em trecho da reunião, ele diz que os ministros do Supremo são “vagabundos” e que deveriam ir presos.
O magistrado citou “aparente crime contra a honra dos ministros do Supremo, supostamente perpetradas” por Weintraub. “As expressões indecorosas, grosseiras e constrangedoras por eles pronunciadas ensejou a descoberta fortuita ou casual de aparente crime contra a honra de integrantes do STF”, afirma o ministro.
Confira abaixo alguns do principais trechos da reunião:
“Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia, começando no STF”
Em um trechos, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, disse que colocaria na cadeia os ministros do Supremo Tribunal Federal: “Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia, começando no STF”, disse.
Sua participação na reunião teve início com uma explicação de porque aceitou fazer parte do governo, em que ele afirma que está lá pela “luta pela liberdade” e para “acabar com essa porcaria que é Brasília”, lugar que ele diz ser “um cancro de corrupção, de privilégio”.
“A gente tá perdendo a luta pela liberdade. É isso que o povo tá gritando. Não tá gritando pra ter mais Estado, pra ter mais projetos, pra ter mais… o povo tá gritando por liberdade, ponto. Eu acho que é isso que a gente tá perdendo, tá perdendo mesmo. A ge… o povo tá querendo ver o que me trouxe até aqui. Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia. Começando no STF”, disse Weintraub.
“Eu não vou esperar foder a minha família toda”
Neste trecho, que já havia sido divulgado a transcrição antes mesmo da queda do sigilo do vídeo, o presidente Jair Bolsonaro crítica o fato de não poder trocar “alguém da segurança na ponta da linha”.
“Eu não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira”.
Confira a fala completa do presidente neste trecho:
“O meu particular funciona. Os ofi… que tem oficialmente, desinforma. E voltando ao … ao tema: prefiro não ter informação do que ser desinformado por sistema de informações que eu tenho. Então, pessoal, muitos vão poder sair do Brasil, mas não quero sair e ver a minha a irmã de Eldorado, outra de Cajati, o coitado do meu irmão capitão do Exército de … de … de … lá de Miracatu se foder, porra! Como é perseguido o tempo todo. Aí a bosta da Folha de São Paulo, diz que meu irmão foi expulso de um açougue em Registro, que tava comprando carne sem máscara. Comprovou no papel, tava em São Paulo esse dia. O dono do … do restaurante do … do pa … de … do açougue falou que ele não tava lá. E fica por isso mesmo. “Eu sei que é problema dele, né? Mas é a putaria o tempo todo pra me atingir, mexendo com a minha família. Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro, oficialmente, e não consegui! E isso acabou. Eu não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira”.
Ricardo Salles propõe mudanças nas regras de proteção ambiental e agricultura
Em sua participação na reunião, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, propôs aproveitar que a atenção da imprensa está voltada para a pandemia do novo coronavírus para fazer uma “baciada” de mudanças nas regras de proteção ambiental e na agricultura e evitar críticas e processos na Justiça.